Durante décadas, os médicos trataram doenças cardíacas, insuficiência renal e diabetes tipo 2 como batalhas separadas. Mas pesquisas emergentes sugerem que estas condições não são incidentes isolados – são facetas de uma síndrome única e profundamente interligada. Este novo entendimento, apelidado de síndrome cardio-rim-metabólica (CKM), está a remodelar a forma como os cientistas e os médicos abordam a prevenção e o tratamento.
As conexões silenciosas
A história de Amy Bies ilustra o problema: anos passados a percorrer receitas para diabetes, colesterol elevado e doenças cardíacas, cada uma delas tratada isoladamente. Em 2019, ela tomava 12 medicamentos, dominada pelos efeitos colaterais. O que Bies experimentou não é uma anomalia. Os pesquisadores agora reconhecem que a disfunção nas células adiposas pode desencadear uma cascata de danos que afetam o coração, os rins e a regulação da insulina. A falha de um órgão acelera o declínio dos outros, criando um ciclo vicioso.
Os riscos são altos. Aproximadamente 90% dos americanos têm pelo menos um fator de risco para a síndrome CKM. Globalmente, 59 milhões de adultos têm diabetes, 64 milhões sofrem de insuficiência cardíaca e 700 milhões vivem com doença renal crónica. Estas condições representam colectivamente a principal causa de morte em muitos países, e as evidências sugerem que todas podem estar ligadas.
A ciência por trás do CKM
As primeiras pistas surgiram há quase um século, com estudos que associavam níveis elevados de açúcar no sangue, pressão arterial e ácido úrico (um sinal de doença renal). O avanço veio na década de 1990 com a descoberta da leptina, um hormônio liberado pelas células adiposas que influencia vários órgãos. Os pesquisadores agora entendem que as células adiposas disfuncionais liberam compostos inflamatórios que danificam o coração, os rins e os músculos. Esta inflamação prejudica a resposta à insulina, levando ao diabetes, e deteriora ainda mais a função dos vasos sanguíneos e dos rins.
O ciclo se intensifica: a resistência à insulina estimula o acúmulo de glicose, prejudicando as mitocôndrias (produtores de energia celular) e desencadeando espécies reativas de oxigênio que destroem os tecidos. Os rins danificados liberam hormônios que pioram a pressão arterial, enquanto as células adiposas obstruem os vasos sanguíneos com colesterol. Esta interligação significa que tratar uma condição sem abordar as outras é muitas vezes ineficaz.
Uma mudança de paradigma no tratamento
A boa notícia é que estão a surgir novos medicamentos para combater a CKM na sua raiz. Os agonistas do receptor GLP-1 (Ozempic, Wegovy, Mounjaro) – inicialmente desenvolvidos para diabetes – provaram ser surpreendentemente eficazes na proteção da função cardíaca e renal. Os ensaios clínicos mostram uma redução de 18–20% no risco de mortalidade entre pacientes com diabetes tipo 2 e doença renal crónica que tomam estes medicamentos. Os inibidores do SGLT2, outra classe de medicamentos, demonstraram benefícios semelhantes, reduzindo a glicemia, retardando o declínio renal e diminuindo o risco de eventos cardíacos.
O processo de aprovação mais rigoroso da FDA para medicamentos para a diabetes, implementado depois de uma investigação de 2007 ter revelado riscos cardíacos ocultos em medicamentos mais antigos, desempenhou um papel crucial neste progresso. Ao exigir testes de segurança abrangentes, os reguladores pressionaram as empresas farmacêuticas a desenvolver medicamentos com efeitos protetores mais amplos.
O Futuro da Gestão CKM
Apesar do ceticismo de alguns (que argumentam que a CKM é apenas uma reformulação da síndrome metabólica), a estrutura está ganhando força. Os médicos reconhecem agora a necessidade de avaliações e tratamentos holísticos. A chave está na detecção e intervenção precoces. Os algoritmos de triagem atuais muitas vezes não conseguem identificar pacientes de alto risco com doença renal, levando a diagnósticos tardios e resultados piores.
O surgimento da síndrome CKM exige uma mudança fundamental na forma como abordamos as doenças crónicas. Ao reconhecer a interligação da saúde cardíaca, renal e metabólica, podemos avançar para estratégias de prevenção e tratamentos mais eficazes que abordem as causas profundas destas epidemias interligadas.
Concluindo, a estrutura CKM não é apenas um novo rótulo; é um apelo ao cuidado integrado. Reconhecer estas doenças como partes de uma única síndrome é fundamental para melhorar os resultados dos pacientes e reduzir o fardo global das doenças crónicas.
